"Você entende que digo o que não quero e que, o que eu quero, eu não digo?” Gabriel Chalitas
O sentimento de culpa e revolta tomavam o meu corpo a cada dia que eu voltava de uma caçada. Culpei você por isso. Havia-me trago para o seu mundo com promessas de felicidade e, no entanto, havia me jogado em uma jaula com leões. Ainda era muito inexperiente e você não estava lá para me auxiliar, mostrar-me o caminho, tirar dúvidas, ajudar a atravessar essa nova fase em minha vida, ajudar a enfrentar todas as incertezas de uma não mais vida que eu ainda não havia me dado conta. Estava morta e tive medo que meus nobres sentimentos morressem também. Odiei você por isso.
Odiei ainda mais por saber que estaria nos braços de outros homens e você encarava isso como apenas negócios. Não sentia ciúmes? Seu coração estava gelado a tempo demais para notar certos sentimentos, para enxergar o quanto estava infeliz com tudo o que estava acontecendo. Infeliz com certos fatos aos quais eu era submetida.
As responsabilidades que adquirimos enquanto vampiros só faziam nos afastar cada vez mais. Não tínhamos mais tempo para estar um com o outro e quando juntos só tratávamos de negócios. Nossas vidas agora eram simplesmente regidas pelas leis sublimes que estavam acima de nossas vontades.
Como pude deixar que isso acontecesse? Agora tão perto mais ao mesmo tempo tão longe. Fiquei enfurecida com que havia me transformado e a qual ponto havia chegado nosso relacionamento. Começava a sentir meu coração se esvaziar dos sentimentos nobres que sempre prezei. Duvidei que me amava e duvidei que ainda pudesse amá-lo.
Não queria ir embora, não queria deixar de ser vampira, não queria te deixar, mas eu não podia ser vampira porque te amava e sim porque fiz esta escolha por amor a mim mesma. Mais uma vez precisava de respostas e tomei uma decisão muito difícil, resolvi então não mais consumir sangue. A morte seria lenta e dentre alguns dias eu estaria morta. Mas o que é a morte para um vampiro se não a ausência de toda sua humanidade. Eu já estava morta para o mundo, mas precisava estar para você.
Você foi muito diplomático quando te dei a notícia. Sentou-se ao chão. Refletiu. Algumas lágrimas, talvez, pudessem ter percorrido seu rosto se não fosse o fato de ser vampiro, o que tornava tal momento ainda mais frio. Nada mais além disso. Não eram as respostas que eu procurava e me pus a chorar, sozinha sem que você soubesse.
Você entende que digo o que não quero e que, o que eu quero, eu não digo? Bastaria um pedido para que eu ficasse, para que não fosse embora. Bastaria que o vampiro doce e gentil que eu conhecera a tempos atrás aparecesse novamente a minha frente. Eu não pensaria duas vezes em mudar de ideia. Mas isso não aconteceu.
Triste fim que um dia me trouxe aqui. Hoje choro por não saber quem sou por não lembrar quem fui. Ainda continuo andando sem rumo na tentativa de me descobrir. Uma vampira com sentimentos humanos. Há duas de mim agora. Uma doce e gentil menina, coração que bate subitamente sem parar, e outra a qual tenho que conviver com instintos selvagens e impiedosos e que lamenta não poder ver mais suas lágrimas.